Já imaginou encher o tanque do seu veículo com etanol de qualidade e ainda ajudar a diminuir a emissão de CO2 na atmosfera? Essa prática sustentável pode se tornar realidade por meio de um estudo realizado por pesquisadores brasileiros na Universidade de São Paulo (USP).
Para a realização do estudo, a empresa Shell e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) financiam o programa Carbon Capture and Utilization (CCU) executado pelo Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI).
Com o programa de pesquisa de captura e utilização de dióxido de carbono (CO2), os pesquisadores brasileiros do Instituto de Química da USP (IQ-USP) pretendem transformar CO2 em etanol, como também transformar o gás carbônico em matéria-prima para a produção de plásticos.
Dessa forma, o estudo pode alavancar, ainda mais, a produção de etanol no Brasil e diminuir as emissões de CO2 na atmosfera devido ao reuso pela indústria química. De acordo com a coordenadora do programa, Liane Rossi, a equipe do RCGI já conseguiu transformar cerca de 30% do CO2 em metanol em outro projeto realizado pela equipe.
Para isso, os pesquisadores realizaram o processo químico de hidrogenação, ou seja, misturaram CO2 e hidrogênio em um catalisador com alta pressão e baixa temperatura. O catalisador utilizado no procedimento era composto de dois óxidos: um de titânio e outro de rênio.
Qual é a redução de emissões de CO2 quando usamos etanol?
Segundo informações da Embrapa, o consumo de etanol em relação ao consumo de gasolina reduz cerca de 73% da emissão de CO2 na atmosfera. A pesquisa realizada analisou o consumo do etanol produzido a partir da cana-de-açúcar, o qual é considerado de primeira geração devido à sua matéria-prima: a sacarose.
O etanol que será produzido no projeto “Desenvolvimento de rotas catalíticas para transformação de CO2 em produtos químicos e materiais” é considerado de terceira geração, já que a sua matéria prima será o dióxido de carbono. Devido à sua forma de produção, o etanol produzido a partir de CO2 pode ser mais benéfico ao meio-ambiente, já que o gás carbônico não entrará em contato com a atmosfera.
Com esta pesquisa, o Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI) demonstra o seu interesse em contribuir com as questões climáticas do país. Dessa forma, os pesquisadores da equipe pretendem ajudar na meta assinada pelo Brasil no Acordo de Paris: reduzir a emissão de gases de Efeito Estufa.
Para 2025, a meta estipulada gira em torno de 37%, enquanto para 2030 a meta aumenta para 43%. De acordo com a pesquisadora Liliane Rossi, os pesquisadores pretendem verificar a viabilidade de capturar e converter o CO2 em etanol por meio de usinas de etanol.
E, até mesmo, transformar as usinas em biorrefinarias através da modernização da produção e da estrutura da indústria. Com o objetivo alcançado, o Brasil pode diminuir a sua emissão de CO2 na atmosfera e ainda aumentar a alta produção de etanol.
Por que o etanol é menos poluente?
Em comparação ao diesel e à gasolina, o etanol é o combustível que menos polui a atmosfera e o meio ambiente como um todo. Devido aos catalisadores presentes na produção deste combustível, o dióxido de carbono é transformado em substâncias que causam menos danos ao meio ambiente.
Além disso, dirigir um veículo movido a etanol produz menos poluentes do que veículos movidos à gasolina ou diesel porque a queima de etanol produz menos 25% de dióxido de carbono do que a queima de gasolina. Dessa forma, consumir etanol é uma forma de diminuir os seus impactos, enquanto consumidor, ao meio ambiente.
Em contrapartida, o consumo de diesel possui uma alta concentração de dióxido de carbono em sua composição e é considerado um combustível poluente à atmosfera. Além disso, alguns estudos apontam a influência do diesel em problemas de saúde na população, desde alergias até câncer.
Como transformar CO2 em etanol?
Para a captura de gás carbônico e sua respectiva conversão em etanol, os pesquisadores da USP precisam vencer um desafio: a criação de catalisadores que transformem o CO2 em álcoois superiores, os quais são semelhantes ao etanol (CH3CH2OH).
Com este desafio vencido, os pesquisadores classificam o material produzido como um etanol de terceira geração, já que a sua matéria-prima é o dióxido de carbono. Em 2020, a equipe do RCGI alcançou o êxito em um projeto que envolvia a captação e conversão de CO2 em metanol por meio de catalisadores.
No projeto, a equipe converteu cerca de 30% do gás carbônico e chegou a 80% de seletividade para o metanol (CH3OH). Segundo Rossi, o sucesso deste projeto se deve a catálise, ou seja, a produção industrial de uma substância com mais velocidade e menos energia.
Para a eficácia no processo de catálise dos materiais, a engenheira química Liane Rossi aponta uma série de estratégias que serão testadas pela equipe do projeto. Inicialmente, a estratégia utilizada será a conversão de CO2 em água, luz e um foto catalisador – o processo é conhecido como fotossíntese artificial.
Além de uma fotossíntese simulada em laboratório, os pesquisadores pretendem realizar outros processos, tais como a eletro catálise (processamento de uma substância química em diversas velocidades), a termo catálise (processamento de uma substância química em diversas temperaturas), dentre outras estratégias.
Com o etanol produzido em laboratório, a coordenadora do projeto afirma que a equipe pretende encontrar outras utilidades para o etanol, além do uso como combustível. De acordo com Rossi, os produtos que utilizarem o etanol de terceira geração terão a mesma qualidade que os produtos produzidos com etanol de primeira geração (produzido com cana de açúcar).
Essa prática ainda pode diminuir a exploração de recursos fósseis, como também a emissão de CO2. Simultaneamente, os pesquisadores do RCGI pretendem desenvolver outros produtos e descobrir a viabilidade da produção destes produtos em escala industrial.
Os produtos a serem desenvolvidos nestes três anos de projeto podem ser utilizados em acetatos (ácido acético), em plásticos (polímeros) e, até mesmo, na fabricação de pneus (butadieno, monômero de borracha). A viabilidade de produção em escala industrial será testada após a produção dos produtos e levará em consideração a viabilidade econômica e de produção.
Dessa forma, a equipe de pesquisadores do RCGI descobrirá se o seu projeto sairá dos corredores do Instituto de Química da USP e seguirá para a indústria privada, uma indústria dos próprios pesquisadores ou, até mesmo, para a iniciativa pública.
A conversão de CO2 em etanol será um avanço para a ciência, a indústria, e principalmente para o meio ambiente. Além de garantir um combustível mais limpo para toda a população brasileira e internacional.